TEMÁRIO
EIXOS TEMÁTICOS DO 59º COBEM
Tema Central:
EDUCAÇÃO MÉDICA TRANSFORMADORA: REVISITANDO O PASSADO, VIVENDO O PRESENTE E ESPERANÇANDO O FUTURO.
EIXO I – Paulo Freire e a escola médica brasileira
Paulo Freire, sem dúvida, representa uma grandiosa produção e inestimável colaboração em defesa de uma educação socialmente referenciada, emancipatória e valorizadora do indivíduo e dos atores envolvidos no processo de ensino e aprendizagem, ou seja, docentes e estudantes. Sua contribuição se reflete diretamente na discussão das relações entre professor/a-estudante-paciente-família-comunidade baseadas no diálogo, na valorização dos diferentes saberes/experiências e na fundamentação da educação popular em saúde. Dá-se ênfase à sua contribuição para a discussão das metodologias ativas, especialmente na Metodologia da Problematização, assumindo a importância da articulação teoria e prática a partir da realidade.
Nestes momentos de incerteza, Paulo Freire nos convida: “É preciso ter esperança, mas ter esperança do verbo esperançar; porque tem gente que tem esperança do verbo esperar. E esperança do verbo esperar não é esperança, é espera. Esperançar é se levantar, esperançar é ir atrás, esperançar é construir, esperançar é não desistir! Esperançar é levar adiante, esperançar é juntar-se com outros para fazer de outro modo…”.
Este eixo, para além de prestar uma homenagem a Paulo Freire no centenário de seu nascimento, congrega todas e todos para discutirmos a relevância de sua obra e seus reflexos na educação médica brasileira, tanto na programação científica do 59º Cobem como na chamada de trabalhos científicos.
EIXO II – Formação social, política e cidadã na medicina brasileira
A pandemia da Covid-19 provocou diversas mudanças nos caminhos da educação médica brasileira. Discutimos essa mudança em uma perspectiva instrumental, sucessivas vezes, ao longo do último ano. Nesse período, contudo, a despeito da existência de Diretrizes Curriculares Nacionais para graduação em Medicina que sinalizam claramente o perfil do médico egresso para atuar no século 21, colocou-se em cheque a construção histórica do que se entende por formação médica.
No que tange à sua sensibilidade ao cuidado, sua visão política de mundo e sua criticidade sobre a ciência, a formação médica tem sido suficiente? Em um momento histórico de ascensão do autoritarismo, do protofascismo e do negacionismo “antivacina, anti-isolamento, antimáscaras”, como os profissionais que já formamos e os que formaremos estão se posicionando?
Este eixo, à luz da máxima de Paulo Freire “Educação não transforma o mundo. Educação muda as pessoas. Pessoas transformam o mundo”, se propõe a discutir acerca da formação política, social e cidadã do médico, sobre a medicina e sua relação com a sociedade, além de buscar entender o percurso histórico que nos trouxe às circunstâncias atuais.
EIXO III – Releitura curricular em tempos de pandemia
A pandemia trouxe uma série de transformações no mundo que impactaram as escolas médicas e a necessidade de releitura de seus currículos. Há necessidade de rever o que estamos privilegiando nos nossos projetos pedagógicos e como estamos integrando teoria e prática, reconciliando o ensino da saúde coletiva com a clínica. O ensino médico precisou, em tempo real, mudar para incluir ou ampliar questões específicas relacionadas à infecção por uma doença pouco conhecida e seu impacto na sociedade, na vida das pessoas e no cotidiano do processo de trabalho na saúde. A epidemiologia nunca foi tão destacada. A determinação social ficou evidente. Há necessidade de uma formação que privilegie a vivência na rede de cuidados valorizando a atenção primária como espaço de: promoção, prevenção com ênfase na vacinação e de assistência individual, familiar, coletiva, realização de exames laboratoriais, novas estratégias como telemedicina ou telessaúde, atenção domiciliar, assim como a necessidade de formação na emergência, urgência e na hospitalização e reabilitação.
Este eixo nos convida a compartilhar questões como evidências científicas, racionalização de recursos, segurança do trabalho, do profissional e do paciente, cuidado ao paciente, autonomia e restrições pessoais que devem ser tratadas à luz de conceitos da ética e das ciências humanas. Podemos problematizar e ampliar a educação interprofissional, interdisciplinar e o trabalho colaborativo, a formação profissional para o cuidado que considere pessoas e comunidades invisibilizadas e a voz dos pacientes. Neste sentido, com base em Paulo Freire, podemos dizer que a educação problematizadora não se funda em uma compreensão dos homens como seres vazios a quem o mundo ou a escola médica possam encher de conteúdos. A educação problematizadora considera a realidade cotidiana vivida como essencial à formação transformadora. Assim, chamamos à formação que vá ao encontro das necessidades em saúde das populações e que responda às demandas do SUS. Chamamos à oportunidade de vivenciar práticas, aprofundar conhecimentos, refletir criticamente e atuar com as equipes no cuidado da pandemia como experiência única de formação.
EIXO IV – Avaliação no processo de ensinar e aprender
O processo de ensino-aprendizagem vem passando por mudanças substanciais de concepção, modelo, planejamento e execução, a partir das novas necessidades colocadas no cotidiano do afastamento social. Novas maneiras de ensinar e aprender no mundo virtual, integradas à reflexão sobre as experiências nos cenários de prática, tiveram um espaço inédito nos currículos das escolas médicas, no Brasil e no mundo, somadas à paralisação ou suspensão parcial e temporária das atividades práticas nos anos iniciais. Esses fatos influenciaram a abertura de um caminho nunca antes explorado no aprendizado em ambiente presencial ou virtual. Nesse contexto, se faz necessário ampliar o debate sobre o sistema de avaliação como parte desse processo de ensino-aprendizagem, na pertinência dos métodos avaliativos e da coerência entre as práticas e rotinas em avaliação em todos os âmbitos (formativa, informativa e somativa) com a proposta pedagógica. É preciso ressignificar também os processos de avaliação, monitoramento e acompanhamento de nossas instituições, impactados pela pandemia e suas exigências de adequação.
Este eixo nos convida a refletir, trocar experiências e consolidar análises que terão como alvo quantificar o impacto dessas ferramentas no processo de ensino da pessoa aprendiz e no desenvolvimento de competências de seus educadores. Entender os impactos dessas mudanças no desenvolvimento das habilidades e do ser social é fundamental para a formação médica. Nossas escolhas se aproximam do conceito direcionador da avaliação que nos ensina Paulo Freire: “A avaliação é a mediação entre o ensino do professor e as aprendizagens do professor e as aprendizagens do aluno, é o fio da comunicação entre formas de ensinar e formas de aprender. É preciso considerar que os alunos aprendem diferentemente porque têm histórias de vida diferentes, são sujeitos históricos, e isso condiciona sua relação com o mundo e influencia sua forma de aprender. Avaliar, então, é também buscar informações sobre o aluno (sua vida, sua comunidade, sua família, seus sonhos…), é conhecer o sujeito e seu jeito de aprender”.
EIXO V – Cuidado como ato pedagógico e coletivo
Desde março de 2020 a educação médica brasileira, representada na escola médica, em seus educadores, educandos, gestores e comunidade, reconheceu a importância de aprendizados advindos da experiência coletiva da pandemia. A compreensão da educação como uma prática social contextualizada e atenta às necessidades de seu povo e do ato educativo/pedagógico como referência para o ato de cuidado dos profissionais de saúde que formamos traz a dimensão da responsabilidade da escola médica. Paulo Freire nos ensina o que é ato pedagógico como prática de cuidado com compromisso coletivo quando afirma que “é preciso que a educação esteja – em seu conteúdo, em seus programas e em seus métodos – adaptada ao fim que se persegue: permitir ao homem chegar a ser sujeito, construir-se como pessoa, transformar o mundo, estabelecer com os outros homens relações de reciprocidade, fazer a cultura e a história […] uma educação que liberte, que não adapte, domestique ou subjugue”. Nossa frágil humanidade se revelou no enfrentamento da pandemia e nos permitiu não saber, valorizar as respostas construídas de forma coletiva, aprender juntos, exercitar a solidariedade e o autocuidado que se expande e alcança o cuidado com os demais.
Este eixo nos convida a confiar na nossa capacidade de transformar, de transpor, de transcender. E a compartilhar práticas de cuidado e educação que se conectam no processo de (trans)formação de pessoas. Ao cuidarmos da vida em nossos atos pedagógicos dentro da escola ensinaremos um modelo de cuidado que considera as singularidades, admira as trajetórias, preocupa-se verdadeiramente com o outro, reconhece a complexidade e busca construir juntos as melhores estratégias de segurança, equilíbrio e liberdade para seguir a vida lá fora, além da escola de medicina.